Cristina Ribeiro - Prosa & Verso
"Eu sei que canto e a canção é tudo" - Cecília Meireles
Textos
(N)amor(o) sem paixão
          Fiz isso uma vez na vida. O rapaz era bonzinho e a didática das 'cumade' consistia em repetir mecanicamente o mesmo dito: o amor vem depois. Vai! Vai! Vai! Vaaaaii!

          Aí, começou a caminhada e as ginásticas. A mão dele era pesada, grossa e molhada. Não combinava com nenhuma das minhas mãos, mas não tinha jeito, eu tinha que entregar pelo menos quatro dedos pra ele. E a gente ia por calçadas intermináveis em um mundo que eu não conhecia. Parece que houve uma espécie de eclipse que deu fim em tudo. Só ficou o chão lascado e os cascalhos.

          Quando eu namoro, gosto de ouvir sons de veludo, mas foi uma fase em que tudo gritava e eu sentia uma vontade permanente de esvaziar todo o sistema digestivo. Da boca dele expirava um vapor quente de odor indefinido, talvez o resultado de tudo o que ele ingeriu no dia. Enfim, melhor não continuar a narrar esse tour porque o ponto final é justamente a pior região: foi quando me pareceu estar perdida em um recôndito com um lagarto cheio de tentáculos tentando se apoderar de mim.

          As conversas: me lembro que  a expressão "nossa casinha" era uma constante e ele fazia questão de enfatizar que esse negócio de literatura é bobagem e  escrever, compor... - isso  é um sonho, amô!

          Enfim, o pânico do não saber porque e pra quê tomou conta de mim. Como Alice, caí num buraco vazio que não dava para lugar nenhum, nenhuma maravilha...

          Até o tempo ficou entediado por tanto tempo que perdeu com nós dois. Nós?! Dois?!

Cristina Ribeiro R
Enviado por Cristina Ribeiro R em 02/02/2025
Alterado em 03/02/2025