Estórias acerca de nós
Há "n" estórias acerca de nós, criaturas quase indecifráveis que, ao mesmo tempo, damos o corpo à família, o peito ao amado e ao filho; e jorramos sem maiores consequências como se fôssemos imortais.
Lana se lembrou de um dia em que o seu cunhado saiu todo ensanguentado do quarto. Sua irmã pintou seu pijama ao longo da noite. Pintou também os lençóis, o colchão... foi aquela subtração no pagamento do mês, porque foi preciso trocar tudo.
O cara tinha muito nojo. As trocas, então, foram necessárias, mas não que tenham sido fáceis. Tudo ocorreu sob a batuta do ainda intitulado chefe de família, que se mostrou bem contrariado com aquela perda quase que mensal em seus proventos, como se aquela circunstância biológica fosse um crime de fêmeas.
Mulher é assim mesmo. Dá gasto e dá desgosto, disse ele, porque costuma jorrar, a nível de esgoto, todos os impropérios, principalmente pela boca. Só faltou acrescentar ao comentário que isso ocorre quando somos o centro de violência psicológica e injustiça. Tentando explicar que bastava lavar, deixar de molho, revestir o colchão com um forro impermeável, tudo o que Luana conseguiu foi mais desaforo.
Coube a ela, então, a troca mais simples que se resumiu a uma dupla troca de troca: ficou com as coisas ensanguentadas e trocou o machão por uma mala de cerveja semanal que, longe de substituir-lhe o marido, lhe dava muita alegria, prazer e emoção - coisas raras nesta instituição que se chama casamento.
Cristina Ribeiro R
Enviado por Cristina Ribeiro R em 15/02/2025
Alterado em 15/02/2025