Meu uni-verso e o mundo
O meu uni-verso e o mundo são distintos. Não cabem no mesmo espaço. Separá-los é minha especialidade. O mundo e suas geleiras, eu ponho no pacífico. O meu uni-verso, no atlântico. Sabe cumé, né? Azul... quentinho... da cor e da temperatura que eu gosto. E cada um de um lado. Vivo para unir versos e compor poesias. Sim, sou a criatura estúpida que eles dizem que sou. É muito bom ser assim. Das nubes, vejo meu amor. Quando ele fala, se agiganta; quando cala, minha alma sonha e canta.
O mundo não cabe, não sabe, não entra no meu espaço, meu território sagrado. Ele me sufoca, come as minhas horas, some comigo, e eu preciso de mim. Sou aquela que não carece de espelho para se ver. Só tenho de ver as coisas que me preenchem e me realizam. Se eu me vejo nelas, então eu me sinto com a plena sensação de existir. E quando alguém é capaz de me matar de amor... quanto mais morta, mais existo, mais vivo, mais vi-verei em todos os tempos do verbo da existência. É nesse alicerce que eu construí/construo o meu uni-verso.
Precisou de cadastro, formulário, ficha? Ponho a casa abaixo, encontro a pasta de documentos e vou. Terminou a burocracia, tá tudo nos seus lugares com seus números? E a conta corrente, tá bem forradinha, as horas de trabalho estão remuneradas pelo empregador? Então, tchum tibum no meu mergulho. Vou brincar com ariranhas no fundo do rio e ouvir o cantar das águas. De lá, ouço discussões de paz e vejo o avanço da indústria bélica distribuindo, em larga escala, a sua produção. Minha pele de escafandro me blinda. De vez em quando, eu venho à tona. Volto três vezes por semana para enviar planilhas que me garantem café e janta e saúde ao país; uma vez por mês, atendo ao primeiro grito de um boleto, compra do mês num supermercado, às recomendações médicas para verificar a glicose e a pressão. Mas, se abro um mínimo de espaço, se demoro um pouco na estrada, sou obrigada a ouvir a repetição de repertórios antigos que vão tentar me convencer de tudo o que eu perdi: uma vida na indústria fonográfica que me faria rica e famosa em capas de revista; e também do partidão daquela família poderosa - garantia de boletos pagos mensalmente e um closet repleto de tralhas. "- Tem mulher incapaz de segurar um homem!". Ainda ouço esse grito familiar estapiando os meus tímpanos.
O mundo é pra quem quer ficar rico toda hora. O cara já é rico e ainda quer ficar mais rico. Vê caixa registradora na aurora, no pôr do sol. Sofre, com certeza. Já pensou poder cobrar pela visão de cada arco-íris e cada estrela? Que espetáculo vantajoso seria! Já estão cobrando pela água, mas o ar ainda está livre, ainda é grátis respirar. Ainda bem que a vida, a natureza, não escolhem as peles a refrescar e acalorar nem escolhem os olhos que poderão avistar suas obras-primas.
Cristina Ribeiro R
Enviado por Cristina Ribeiro R em 18/04/2025
Alterado em 18/04/2025